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Casa no interior


Minha amiga sempre fala da casa que era dos seus pais e ainda é mantida por ela e suas irmãs no interior de Minas. Quando precisa recarregar suas energias, ela vai até lá, mesmo sem os pais vivos. Isso me fez recordar que por muitos anos, quando criança, eu sonhava em ter uma avó para visitar no interior, e sabia exatamente como seria a sua casa.

 

Ela era bege e tinha um pequeno jardim na frente, com roseiras dos dois lados. No meio da casa, uma escada de três degraus, com o piso vermelho, dava em uma pequena varanda à esquerda. Eu sabia que o quarto dos meus avós, ficava à direita, mas sem porta para a varanda, apenas uma janela que compunha a fachada da casa. Eu imaginava também a cidadezinha, onde eu gostaria de passar as férias. Ela era bem arrumadinha, com casas pintadas de branco e com detalhes em cores diversas: azul, verde claro e amarelo. Todas as casas tinham um pequeno jardim na frente e davam para uma praça central, também muito bem conservada, onde era possível brincar e correr. E como brinquei e me escondi nessa praça. Cresci com essa casa dentro de mim, algo que me oferecia sonho, fuga e refúgio.

 

Jovem, passei a sonhar com uma vida no exterior. A fantasia não era tão rica em detalhes como a casa da infância. Na época, eu nem sabia como era a vida fora do país, e como eram as moradias por lá. Eu não pensava em uma cidade específica, apenas em algo relacionado ao estrangeiro; um outro tipo de fantasia, mais ligada ao comportamento das pessoas! Eu imaginava uma cidade onde adotaria padrões e exigências bem diferentes do que a minha família me impunha. Sairia de casa quando quisesse, sem ter que dar muita satisfação para a minha mãe. Mudaria o corte de cabelo, usaria meias coloridas, calças mais curtas e mocassins. Andaria sem medo de pivetes e usaria metrô ao invés de ônibus. E na atmosfera da cidade que imaginava, eu resolvia muitos conflitos sem ter que brigar de verdade em casa.

 

Os anos se passaram, eu me casei, tive filhos que também não tiveram avós com casas no interior, mas que viveram suas próprias aventuras na casa real das avós, sendo que uma delas é a mesma onde passei a minha infância. Meu marido e eu resolvemos nos mudar com os filhos por alguns anos para o exterior e muito do que eu havia sonhado e projetado não foi encontrado lá, até porque os tempos e os meus sonhos quando mudei eram outros. Adulteci. A realidade da vida vivida foi bem diferente de um sonho, e a minha aspiração acabou ficando mais ligada a ter de volta tudo que eu deixei na cidade onde sempre morei. Voltamos então para a cidade onde nasci, onde até hoje costuro tempos, sonhos e histórias.

 

De volta, sempre saio para tomar café com a minha amiga que traz lá do interior dela seus causos, cheios de muitas expressões regionais, muitas das quais, eu preciso de explicação.  Viajo nas suas histórias, e às vezes, penso que a cidade que ela me descreve é bem ali, colada na cidade para onde eu viajava imaginariamente.

 

O que vem se revelando é o sonho de que em um dia, quem sabe, eu simplifique ainda mais a vida e me mude para uma casinha amarela, numa cidade do interior de apenas uma rua.

 

Uma questão de voltar para casa no meu interior.

 
 
 

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Amei todos os textos!!

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